17 - NÃO HÁ MAIS FLORES DE ALGODÃO ENTRE A PALHA SECA DO MILHARAL


Não há mais flores de algodão entre a palha seca do milharal
O verão já finda e deixa na sua retaguarda o rastro de pouca piedade
Alívio das horas caudalosas é a noite por vir
O equilíbrio entre os extremos é bem as margens dos meios
Restam os corvos nos talos gritantes, como diurnos fantasmas negros
As rapinas noturnas guardam o deserto sustentado por sombras inertes
Que rangem ao toque da brisa, como a tocar ferida incurada
Que não cicatriza por não ter o remédio para a sede das raízes
Sobre o telhado da argila endurecida e fria na noite dispersa
Tocam as leves e macias patas do felino faminto e agourento
Que demônio obedece ou que ordens guardam?
Bruxa criatura! Ao dia um mendigo deplorável, a noite demônio temível.
Lua, o olho do deus pagão que cultua a ignorância dos cegos.
Vigia os passos dos discípulos secretos por seus caminhos conhecidos
Levanta o cobertor dos sonâmbulos e fecha seus olhos enquanto anda
Desliza suave a noite como seda sobre corpo de cristal
Não há mais flores de algodão entre a palha seca do milharal
Nem há mais as mãos feridas nos espinhos
Apenas a marca ressecada na depressão do solo
Pé de criança, do inverno passado quando colhia, sorridente, as espigas de milho.

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